O nascimento da obesidade: um estudo genealógico do discurso patologizante
Resumo
Este estudo teve por objetivo investigar a emergência histórica do discurso patologizante da obesidade no Ocidente. A metodologia utilizada foi a análise de discurso na perspectiva da arqueo-genealogia de Michel Foucault. De acordo com
as fontes consultadas, refutou-se a hipótese sugerida por vários historiadores de que houvesse um discurso patologizante da obesidade equivalente ao da
contemporaneidade na Pré-história, na Antiguidade, na Idade Média e no Renascimento. Concluiu-se que tais alegações decorrem de projeções conceituais
retrospectivas na análise das fontes históricas, assim como inferências questionáveis. As evidências encontradas sugerem que a patologização do tamanho corporal e/ou da gordura corporal considerados excessivos teria ocorrido em
meados do Século XVII e teria permanecido marginal até meados do XIX, quando se popularizou. Durante esse período, denominado de nascimento da obesidade,
constatou-se influências estéticas, morais, religiosas, políticas e de gênero nos discursos médicos ao longo do processo de patologização da obesidade. A pesquisa permitiu, ainda, perceber a existência de uma dissonância discursiva que
inviabilizaria a narração de uma história linear e homogênea, como alguns historiadores redigem; além de demonstrar que a comicidade, a estigmatização e a ridicularização estiveram entre as estratégias utilizadas, inclusive pela medicina, na
patologização da condição. Por fim, a investigação permitiu descrever como agentes discursivos legitimaram a constituição de um ideal biológico a partir do conceito de normalidade, de que forma o conceito de risco sustenta, ainda contemporaneamente, o discurso patologizante e como este legitima o exercício de um biopoder normalizador.