Para o bem e fielmente, sem dolo, nem malícia: Ações de Liberdade em Canguçu (1868 – 1887).
Abstract
O texto intitulado “Para o bem e fielmente, sem dolo, nem malícia” é uma pesquisa que tem como base as Ações de Liberdade de pessoas escravizadas, da cidade de Canguçu, nas últimas três décadas do período imperial. A frase faz referência a um breve juramento feito pelos agentes sociais que estavam participando dos processos e que por vezes tinham interesses outros dentro daquela situação. Uma Ação de Liberdade, é um procedimento judiciai, uma alternativa jurídica que as pessoas escravizadas encontravam para buscar perante a lei ou o Estado nacional a sua condição de liberdade. O procedimento ocorre, em muitos casos, depois de uma tentativa de conquista da liberdade por vias corriqueiras e cotidianas, mediante um acordo com seus senhores ou seus herdeiros. Ou após uma insegurança jurídica quanto a seu destino por conta do falecimento de um antigo senhor ou por um confronto direto com o mesmo. Essas fontes documentais estão depositadas no Arquivo Centralizado do Judiciário de Porto Alegre/RS e pela primeira vez recebem um tratamento acadêmico. No que diz respeito ao seu caráter judicial, esse tipo de documento representava uma via legal de luta pela liberdade, por direitos, se tornando acima de tudo uma forma de resistência contra a escravidão. Além disso, traz algumas peculiaridades, como a necessidade de transcrição paleográfica, por se tratar de um português mais antigo, além de apresentarem também discursos jurídicos que detém até outra forma de pensar a escrita, pois a linguagem utilizada é específica e técnica, que torna o vocabulário e o seu conteúdo mais densos. A cidade de Canguçu está situada na Serra dos Tapes, a qual forma junto com a Serra do Herval, a região gaúcha das Serras do Sudeste, serras estas divididas pelo rio Camaquã, que limita ao norte o município. As terras de Canguçu, como as de outros distritos situados nas serras do Tapes e do Herval, são as mais antigas do Rio Grande do Sul, que faz parte do Escudo Rio-Grandense, de formação no Período Arqueano. Assim como o material é inédito, o desenrolar desses processos contém muito de uma realidade ainda não visitada. São pessoas escravizadas como agentes sociais, sujeitos que utilizam os mais variados meios, para alcançarem o fito da liberdade. As ações de liberdade demonstram muitos momentos de resistência, quando se observa o histórico de lutas da população negra brasileira, uma memória coletiva de busca por direitos. Evidenciam a atividade da sociedade via estado para com essas pessoas. Sendo assim, por esses documentos se pode perceber as escolhas estratégicas de quem resistia. E a interação dessas pessoas com aparatos que não possuíam destreza para tal. Essas ações são um resultado de um ambiente que as produziu de acordo com as relações de força que detinham o poder, neste caso, o poder de senhores versus pessoas que estavam sendo usadas como mão de obra cativa.
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