Discriminação de gênero na mortalidade de crianças em países de baixa e média renda
Resumo
Introdução: A mortalidade de crianças menores de cinco anos reflete as condições de
vida, assim como a cobertura e qualidade da assistência à saúde. Em condições naturais,
espera-se que meninos morram mais do que meninas devido à sua maior fragilidade
biológica. No entanto, a discriminação de gênero pode mudar essa relação. Objetivo:
Comparar duas abordagens propostas na literatura para identificar países de baixa e média
renda em que há excesso de mortes de meninas e explorar alguns de seus principais
determinantes. Métodos: Foram utilizados dados de Pesquisas de Demografia e Saúde
conduzidas em 60 países de baixa e média renda entre 2005 e 2014. A mortalidade de
meninas observada nesses países foi comparada com valores esperados resultantes de
duas abordagens distintas para estimar o excesso de mortes femininas. A abordagem
“prescritiva” estipula um valor esperado baseado em dados históricos de mortalidade de
populações selecionadas, em que a discriminação de gênero foi considerada baixa ou
ausente. A abordagem “descritiva” é derivada de estimativas globais baseadas em todos
os países com dados disponíveis, incluindo aqueles afetados por discriminação de gênero.
Para avaliar a discriminação de gênero no acesso a cuidados médicos, foi calculada a
proporção de crianças com condições comuns da infância (diarreia, febre, ou sintomas de
pneumonia) que foram levadas a um profissional de saúde qualificado. Esse indicador foi
estratificado por sexo, em nível nacional e por quintis de riqueza. Análises ecológicas
foram realizadas para avaliar se o excesso de mortes de meninas e a busca por cuidado
variaram conforme a região do mundo, a religião predominante, a renda nacional, a
concentração de riqueza e três índices distintos de desigualdade de gênero. Resultados:
Apesar de a magnitude de excesso de mortes femininas variar entre os dois modelos, os
resultados em nível nacional estão fortemente correlacionados (r=0.989; p<0.001). O
modelo prescritivo identificou um excesso significativo de mortes femininas em 20
países; o modelo descritivo identificou apenas um país. Os treze países com maiores
valores de excesso de mortes femininas e os dez países com menores valores são osmesmos de acordo com ambos os modelos. No Sul da Ásia e Oriente Médio/Norte da
África foram identificadas as maiores médias de excesso de mortalidade de meninas. Em
relação à busca por cuidado, oito países foram identificados com diferenças significativas
entre meninas e meninos e, em seis deles, as frequências foram menores entre as meninas.
Quatro países foram identificados em ambas as análises de viés de gênero: Índia, Egito,
Libéria e Iêmen. Observa-se que menor busca por cuidado para meninas tende a ser
observada em países com maior concentração de renda (p=0.039) e predominância da
religião muçulmana (p=0.006). Conclusão: Apesar das diferenças na magnitude das
estimativas, ambos os modelos fornecem um ranking similar de países com excesso de
mortes de meninas. Países nos quais foi identificado viés de gênero demandam atenção
para que seja assegurado cuidado e proteção adequados às meninas.
Collections
Os arquivos de licença a seguir estão associados a este item: