Saussure e a linguística geral: entre leis científicas e princípios filosóficos
Resumo
O intuito desta tese é avaliar o que uma investigação filosófica da noção de
princípios e de leis, partindo do CLG e outras fontes do corpus saussuriano, pode
nos esclarecer do pensamento do mestre genebrino e, secundariamente,
auxiliar-nos a analisar seus desdobramentos em outros campos semiológicos, como
a literatura. Nossa tese busca reavaliar, de uma perspectiva epistemológica e
filosófica, o pensamento saussuriano, suprindo uma lacuna observada na análise
das relações entre "leis" e "princípios", bem como a escassez de estudos filosóficos
sobre o tema. Nossa metodologia é de natureza teórica. A seleção das fontes
saussurianas seguiu um critério temático, priorizando textos que abordam a relação
entre leis e princípios, bem como os aspectos filosóficos do pensamento de
Saussure. Realizamos também uma revisão bibliográfica de textos oriundos do
campo da historiografia da linguística, visando a contextualizar a problemática
analisada. Por fim, recorremos a obras e artigos nacionais e internacionais
relevantes tanto às questões linguísticas quanto filosóficas imbricadas no tema
abordado. A tese está estruturada em cinco capítulos. No capítulo 1, “Leis e
princípios nas ciências, leis e princípios na linguística”, contextualizamos
historicamente o surgimento das leis científicas e sua transposição para a linguística
no século XIX. Analisamos como, sob influência do positivismo, a linguística
histórico-comparativa tentou estabelecer leis universais da linguagem. No capítulo 2,
“As leis no Curso de Linguística Geral”, aprofundamos a análise dos diferentes usos
do termo "lei" no CLG, diferenciando leis diacrônicas, sincrônicas e pancrônicas.
Destacamos o desconforto de Saussure com essa terminologia e sua rejeição da
possibilidade de se conceberem leis linguísticas nos moldes das ciências naturais,
enfatizando a necessidade de uma abordagem alternativa baseada em princípios.
No capítulo 3, “Os princípios saussurianos”, exploramos a distinção entre princípios
epistemológicos e semiológicos, analisando sua interdependência e funcionamento
dentro do pensamento saussuriano. Argumentamos que tanto os princípios
epistemológicos quanto semiológicos funcionam como hipóteses a priori e servem
de base para o desenvolvimento de outros princípios, os quais são específicos a
cada sistema semiológico. Explicitamos que esses princípios fundam-se em
conexão e apresentam a característica de mutabilidade. O capítulo 4, “Saussure e o
projeto semiológico: quais filosofias?”, investiga como a leitura do Curso de
Linguística Geral a partir dos princípios esclarece a filosofia da linguística
saussuriana. Dialogamos com Simon Bouquet sobre os aspectos filosóficos e
metafísicos em Saussure, mas propomos nossa própria interpretação. Defendemos
que, já no século XIX, havia uma filosofia da linguística em sua obra, baseada nos
princípios epistemológicos e semiológicos. Com apoio na concepção de filosofia de
Deleuze e Guattari, demonstramos que Saussure pode ser visto também como
filósofo. Por fim, destacamos que seus conceitos devem ser compreendidos em
relação uns aos outros, e não isoladamente. Por fim, o capítulo 5, “A mutabilidade
dos princípios semiológicos: caminhos para pensar a literatura e re-pensar a língua”,
discutimos como a flexibilidade dos princípios semiológicos permite sua aplicação a
outros sistemas de signos, especialmente na literatura. A partir dos estudos
saussurianos sobre os anagramas e das reflexões de Émile Benveniste sobre
Baudelaire, demonstramos como os princípios saussurianos podem ser ampliados
para a análise do discurso e da criação poética.