Consumo de alimentos ultraprocessados e gordura corporal na primeira infância: Coorte de Nascimentos de 2015
Resumo
O consumo de alimentos ultraprocessados (AUP) tem aumentado expressivamente na infância e está associado a padrões alimentares inadequados e a possíveis efeitos adversos à saúde. Na primeira infância, esse consumo pode ser influenciado por fatores familiares e maternos, e seus efeitos podem se estender para o crescimento e a composição corporal. Diante disso, esta tese teve como objetivo investigar o consumo de AUP na infância, por meio do desenvolvimento de um instrumento de avaliação, da análise de fatores maternos associados ao consumo e da exploração de possíveis efeitos longitudinais sobre a composição corporal. O primeiro estudo descreveu e validou um escore de AUP baseado em um rastreador alimentar contendo 16 subgrupos de alimentos. O escore mostrou-se significativamente associado ao percentual de energia proveniente de AUP, calculado a partir de um recordatório de 24 horas, com concordância substancial entre os métodos. O segundo estudo, de delineamento transversal, avaliou a associação entre características maternas e o alto consumo de AUP em crianças de 6–7 anos da Coorte de Nascimentos de 2015 de Pelotas/RS. O alto consumo foi definido pelo escore alimentar com base em 16 subgrupos de AUP consumidos no dia anterior. Foram incluídas dimensões maternas sociodemográficas, comportamentais e de estilo de vida. A prevalência de alto consumo foi de 18,3%, sendo maior entre filhos de mães com baixa escolaridade, renda familiar intermediária, estado civil solteira e multiparidade (cinco filhos ou mais). Além da quantidade, os tipos de AUP consumidos também variaram conforme o perfil materno. Os resultados evidenciam desigualdades sociais no consumo infantil de AUP e reforçam a importância de políticas públicas para a promoção de ambientes alimentares mais saudáveis desde a infância. O terceiro estudo, de natureza longitudinal, avaliou a associação entre a trajetória de consumo de AUP aos 24 meses, 4 e 6–7 anos e a gordura corporal aos 6–7 anos, testando diferentes modelos teóricos (acumulação de risco, período crítico e mobilidade). Foram identificadas associações distintas conforme o sexo da criança: entre meninas, o aumento do consumo precoce esteve associado a maior gordura corporal; entre meninos, o alto consumo contínuo associou-se a menor gordura, embora sem significância estatística após ajustes. Os achados reforçam a relevância de considerar características maternas no entendimento do padrão alimentar infantil e sugerem que o consumo de AUP pode ter implicações distintas no desenvolvimento corporal, conforme o sexo e a trajetória de consumo. A tese contribui com evidências que reforçam a importância de monitorar e reduzir o consumo de alimentos ultraprocessados desde os primeiros anos de vida, considerando aspectos familiares, especialmente o contexto materno, como parte de estratégias para promover uma alimentação mais saudável na infância.