Negra, louca... Assim me (nos) chamaram! Costuralidade, arte/educação e saúde mental de mulheres negras.
Abstract
Esta tese tem como objetivo analisar o tratamento do adoecimento mental de mulheres negras no
âmbito das práticas arte/educativas desenvolvidas nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) em
Pelotas/RS. Neste contexto, as práticas arte/educativas propõem um trabalho terapêutico a partir da
recuperação psicossocial de usuárias/os com transtornos mentais graves, mas que, ao ser
essencialmente forjada no campo da educação torna-se imprescindível atentar-se a outras dimensões,
tais como raça-gênero. Sabe-se que o racismo produziu uma estrutura de desigualdades sociais
colocando grupos raciais ou étnicos em situação de desvantagem no acesso aos benefícios gerados por
diversas instituições e, assim, permitindo que as iniquidades históricas em saúde sejam asseveradas.
Desse modo, o debate sobre a saúde mental é fundamental para problematizar as desigualdades que
impactam diretamente a população negra, em especial, de mulheres negras que formam o grupo mais
aviltado pelo entrecruzamento das múltiplas opressões sociais e raciais. Neste enfoque, o debate sobre
o racismo em suas permanências, mas também em contradições e ambiguidades é imprescindível para
pensar a atualidade dessas relações e, como hipótese, tem-se o Racismo Institucional, por meio de
atitudes preconceituosas e discriminatórias nas rotinas de atendimento dos serviços de saúde pública
como uma prática que contribui efetivamente para manter esse cenário inalterado. Para tanto,
confluímos as questões étnico-raciais na educação e na saúde buscando introdutório debate entre o
racismo institucional e a saúde mental, através do escopo teórico onde autores/as discutem o tema em
diferentes perspectivas culturais e histórias, especialmente no Brasil. Trata-se de uma pesquisa
qualitativa de observação participante que se utilizou de ferramentas metodológicas como entrevistas
semiestruturadas, análise documental e levantamento bibliográfico na interlocução com diferentes
sujeitos e referenciais. Buscou-se revitalizar o fazer metodológico pela possibilidade de uma
Costuralidade arte/educativa na qual a formação docente e as questões étnico-raciais são problematizadas
e se alinham a uma memória afetiva que “costura” a existência de outras mulheres negras através de
suas subjetividades e experiências múltiplas. A análise dos dados aponta que as práticas arte/educativas
nos CAPS frequentemente negligenciam no tratamento do adoecimento mental as dimensões raciais e
colaboram, portanto, para a manutenção das nuances institucionais do racismo em seus processos de
trabalho. Em contrapartida, as mulheres negras interlocutoras da pesquisa elaboram condições de
sobrevivência e de cuidado tanto pelo viés terapêutico quanto pelo “estar junto” aos seus pares,
performando uma resistência política e social que é histórica. Como resultado, encontramos uma
Responsividade individual/coletiva de todos os sujeitos envolvidos em diferentes níveis de consciência
e pela qual as mulheres negras, principalmente, insurgem desde uma estética de existência utilizando-se
de astúcias e maneiras próprias de enfrentamento ao racismo.