#Gordofobiamédica: uma análise discursiva de sentidos em disputa sobre ser gordo
Fecha
2024-03-07Autor
Caetano, Virgínia Barbosa Lucena
Metadatos
Mostrar el registro completo del ítemResumen
Nos últimos anos, as redes sociais têm se mostrado espaços muito produtivos para a
circulação de discursos de denúncia sobre formas de violência legitimadas. Dentre eles,
destacamos a campanha #gordofobiamédica, que visa a discutir sobre a negligência
médica a que corpos gordos são submetidos no sistema público e privado de saúde.
Tendo em vista que tal violência é naturalizada pela formação social capitalista e, por isso,
silenciada pelas mídias de massa e pouco debatida em outros espaços sociais, usuários
de redes sociais, por meio da identificação com a hashtag #gordofobiamédica, passaram
a publicar, em suas contas pessoais e em perfis de militância anti-gordofobia e ativismo
gordo, relatos de situações vividas em visitas a consultórios médicos, ambulatórios ou
hospitais. As histórias incluem situações de negligência médica, humilhação, violência
física e verbal, em razão da forma corporal dos sujeitos-pacientes, além de denúncias
sobre a falta de investimento em infraestrutura, nos serviços de saúde, para atendimento
de pessoas gordas. Partindo disso, tomamos como objeto de estudo o discurso de sujeitos
gordos sobre a gordofobia médica. Selecionamos como corpus para análise testemunhos
sobre gordofobia médica que circulam no Instagram e nos propomos, com base nos
pressupostos teóricos da Análise de Discurso Materialista, a analisar a forma como os
processos de subjetivação de sujeitos gordos são afetados pela disputa de sentidos sobre
o ser gordo na atualidade e os efeitos dessa disputa na circulação de sentidos sobre o
corpo gordo nas redes sociais. Para tanto, a presente tese é composta por quatro
capítulos que exploram diferentes aspectos de funcionamento do arquivo. O primeiro
capítulo contextualiza a discussão proposta, apresenta os materiais que serão analisados
e sintetiza o caminho de pesquisa percorrido até a presente tese e que foi determinante
para a seleção do recorte temático e teórico aqui apresentado. Em seguida, no segundo
capítulo, buscamos refletir sobre as condições de produção e circulação dos testemunhos
em análise, discutindo sobre a constituição de um lugar enunciativo (Zoppi-Fontana, 1999)
a partir do qual o sujeito gordo pode colocar em circulação sentidos sobre si e sobre o seu
corpo não previstos pela formação discursiva dominante, lugar enunciativo esse que se
constitui a partir do funcionamento das redes sociais, como lugar que permite a reunião
de um conjunto de vozes dissidentes que, em outros espaços, costumam ser silenciadas.
No terceiro capítulo, por sua vez, nos dedicamos a observar o imaginário sobre o corpo
gordo colocado em circulação a partir do discurso médico, tal como reproduzido pelos
sujeitos vítimas de gordofobia, e os efeitos desse imaginário no que consideramos, a partir
de Carrenho (2021), como funcionamento testemunhal. Por fim, o quarto capítulo aborda
a análise do processo no qual a ausência de escuta presente na interação entre médico
e paciente converte-se em uma demanda por escuta, que orienta não apenas a
emergência dos testemunhos, mas também permeia o processo de subjetivação presente
nos discursos em análise. A partir das análises desenvolvidas, chegamos à consideração
de que os testemunhos devem ser compreendidos como forma de resistência, uma vez
que, ao expor as experiências de negligência, estigmatização e preconceito, os
testemunhos revelam um descompasso entre a atuação médica padrão e as
necessidades específicas dos pacientes gordos, discordância essa que não se traduz
apenas como uma negação da prática médica, mas também como um ato de denúncia
que desafia os sentidos organizados pela formação discursiva dominante.

